Quer dizer então que emoções desconfortáveis têm lado bom, Thayanne?
Sim! E elas podem te ajudar bastante no aprendizado de novas tecnologias.
Emoções podem causar controvérsias, quando não equívocos, sobre seus significados e funções, o que é natural considerando que estamos aos poucos descobrindo suas potencialidades e possibilidades a partir de estudos científicos. A verdade é que desde a Grécia Antiga existem teorias complexas sobre as emoções e o seu papel. Hoje, embora ainda tenhamos diferentes visões na literatura acerca do conceito, é consenso uma visão evolutiva de que as emoções são importantes para garantir nossa sobrevivência e manutenção da vida em sociedade.
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As emoções têm um papel fundamental para nos fornecer informações relevantes sobre o ambiente ou estado em que estamos e sinalizar mudanças em nosso comportamento; algumas dessas informações são óbvias, outras nem tanto. Por exemplo, sentir medo pode significar que você precisa se afastar de determinada situação ou buscar se proteger; a raiva pode indicar que você se sente injustiçado diante de um acontecimento e te motivar a lutar pelo que acredita; a alegria é um excelente sinal de que algo te faz bem para você cultivar mais momentos assim em seu cotidiano.
A grata notícia é que elas existem para nos ajudar, mesmo que nem sempre seja confortável senti-las. Aproveitando essa breve contextualização, já deixo uma primeira grande dica para você:
As emoções estão aí e vão fazer parte do seu funcionamento durante toda a vida. A questão não é deixar de senti-las, mas compreender o papel delas em nosso funcionamento, encontrar e desenvolver recursos saudáveis para conviver com elas.
Dito isto, vamos a algumas evidências importantes que podem abalar suas certezas sobre as emoções desconfortáveis e possibilitar um outro olhar sobre elas, considerando especialmente as emoções básicas tristeza, raiva ou medo:
1) Essas emoções podem sinalizar informações importantes sobre nós mesmos
Como já dito anteriormente, emoções são excelentes mensageiras, quando aprendemos a entender seus sinais podemos aproveitá-los para nossa organização pessoal com nossos estudos e, consequentemente, com o aprendizado de novas tecnologias. Eu, por exemplo, me sinto irritada quando preciso fazer algo que não tenho domínio. Antes, agindo no piloto automático, sentir irritação me movia para longe da situação em que eu era exposta e eu acabava desistindo de aprender coisas novas ou de experimentar situações que me tirassem da zona de conforto. Na minha cabeça, eu precisava evitar situações que fizessem eu me sentir assim.
Quando comecei a perceber que a irritação estava sinalizando uma necessidade de aprender e conhecer mais sobre determinado assunto, eu passei a olhar para ela de forma diferente, me sentindo mais motivada a ressignificar essa emoção e usá-la para organizar novas leituras e estudos que considerassem esse ponto. Eu continuo me sentindo irritada quando me exponho a situações nas quais não domino, mas sempre que percebo que, na verdade, eu deveria dominá-la, ainda que minimamente, uso isso como energia para me motivar a aprender mais e melhorar. Por vezes, essa energia acaba sendo bem maior do que quando eu acho que sei sobre um assunto e preciso me atualizar sobre ele. Claro que, antes de redirecionar a energia gerada pela emoção, quando muito intensa, eu utilizo algumas estratégias para me acalmar.
Uma outra vantagem de ter percebido isso é que voluntariamente comecei a me expor a situações novas nas quais não domino para trabalhar conscientemente minha tolerância à frustração e paciência. Às vezes perco a mão e me irrito além do necessário? Sim, com certeza! Mas esse é um exercício que já me ajudou a estar bem melhor hoje. Lembre-se: aprender a lidar com nossas emoções é um processo, iremos aprender, desaprender e reaprender durante toda a vida.
O mais importante aqui é saber que nem sempre nossa reação automática a uma emoção é considerada a mais adequada. Quando paramos para avaliar o que de fato a emoção está tentando nos sinalizar, fica mais acessível a construção de recursos e estratégias para lidar com elas.
Quando a gente para de fazer um esforço imenso para eliminar ou reprimir nossas emoções desconfortáveis, sem nem refletir, nos permitimos aprender coisas maravilhosas sobre nós mesmos.
Você pode começar a se perguntar a partir de hoje, quando começar a aprender algo novo ou identificar essa necessidade, qual emoção você está sentindo e o que ela está tentando sinalizar para você, ou seja, qual será a função dela naquele momento?
2) Essas emoções podem te ajudar a processar informações de maneira mais atenciosa.
Alguns estudos já apontam que o humor negativo pode melhorar a maneira como processamos as informações e prestamos atenção nelas, influenciando até mesmo a quantidade de informações que memorizamos. Isso porque sentir essas emoções pode nos deixar mais atentos aos detalhes ao nosso redor, mais céticos, e isso pode ser aplicado ao nosso aprendizado também.
Essa informação é colocada em contraposição à quando estamos muito alegres e animados, a tendência neste contexto é que não estejamos atentos a tantos detalhes e questione menos os fatos ao nosso redor, afinal, se tudo está tão bem, por que me preocupar?
Aplicando ao aprendizado de novas tecnologias, quando reguladas, ou seja, quando não estão tão intensas, as emoções desconfortáveis podem ser grandes aliadas no seu processo de estudos. O cuidado deve ser para que elas não estejam tão intensas, à flor da pele, a ponto de te tirar do eixo. Não existe uma receita sobre como regular nossas próprias emoções, a verdade é que cada um encontra suas próprias estratégias sobre como fazê-lo, mas técnicas de respiração consciente tem se mostrado uma prática muito feliz neste contexto.
3) Podem te estimular a aprender mais
Geralmente quando estamos satisfeitos ou nos sentindo bem com o que já sabemos, não existe um motivo para que a gente se mobilize e vá atrás de novos conhecimentos. Emoções desconfortáveis podem te movimentar para buscar aquilo que você precisa saber e perseverar nos seus objetivos, pensando a curto, médio e longo prazo. Emoções agradáveis tendem a nos deixar na zona de conforto e dificilmente nos mobiliza para sair dela, como já abordado no ponto anterior.
Isso não significa que você deva buscar sempre se sentir mal, tá?
Na verdade, sentir essas emoções não se tornará agradável mesmo com todos esses pontos colocados aqui. A questão é te ajudar a olhar por outra lente, buscando aproveitar o que essas emoções podem trazer de bom para nossa vida. O equilíbrio será sempre fundamental, a questão não é sentir ou deixar de sentir, mas a maneira como lidamos e desenvolvemos estratégias para conseguir aproveitar o melhor daquilo que vivemos. E uma dessas estratégias pode ser começar a compreender por que sentimos emoções e começar de uma vez por todas a fazer as pazes com elas.
Faz sentido para você? Você conhece algum outro aspecto positivo das emoções desconfortáveis?
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E se você ficou curioso para conhecer as principais referências utilizadas neste artigo, deixo aqui embaixo:
Handbook of Emotions - Fouth Edition
Agilidade Emocional
Don’t Worry, Be Sad! On the Cognitive, Motivational, and Interpersonal Benefits of Negative Mood.
Publicado originalmente no Linkedin em 10 de agosto de 2020.